EM QUAL BOLHA VOCÊ VIVE?

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EM QUAL BOLHA VOCÊ VIVE?

Em 1989, eu participava de um programa de integração dos diversos departamentos da Microtec Sistemas, empresa onde trabalhava, quando o gerente de contabilidade e fiscal, um cearense ao redor de seus 40 anos, com muita calma e seriedade disse:

– Vocês nunca viram uma nota fiscal e não sabem da sua importância. Portanto, não sabem o que vendemos.  Sei que todos os seus departamentos e atividades são relevantes, mas vejo que nenhum de vocês já viram uma para saber do que se trata este documento. Quando me pedem para emitir uma nota, isto gera obrigações para empresa, custos e não é tão simples assim as consequências de anulá-la depois.

Ele estava certo.

Éramos um bando de jovens que pensava muito em desenvolver e produzir computadores, mas não tinha uma visão de unidade do negócio da empresa.

A consequência era que o departamento de desenvolvimento se achava o mais importante de todos, pois, sem ele não haveria computador para ser produzido. A produção achava o mesmo, pois, se não produzisse, não haveria máquinas para entregar. Vendas dizia que não adiantava ter máquinas para entregar se ninguém vendesse. Marketing afirmava que ninguém compra o que não conhece. E o RH dizia que a empresa era feita de pessoas, portanto, sem elas, nada aconteceria.

Estavam todos certos em algum grau, mas faltava-lhes a noção de que viam a empresa a partir de somente uma das perspectivas possíveis.

A REALIDADE NOS CHEGA POR PERSPECTIVAS

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Quando você vê o tampo de uma mesa de madeira, imediatamente lhe ocorre que ela deve ter pés e uma estrutura que sustente o tampo. Se você se abaixar, verá os pés e a parte de baixo do tampo, mas não mais a de cima.

Isto ocorre não porque você tenha uma deficiência de percepção, mas porque a mesa também não consegue mostrar todas as suas partes simultaneamente. Ela teria de ser desmontada para isso e deixaria de funcionar como uma mesa.

O mesmo ocorre com outros objetos e com sistemas mais complexos como uma empresa.

Se você considerar como estruturas básicas de um empreendimento: a liderança, o time, a missão, o produto/serviço, o jurídico, os sistemas, a comunicação e o fluxo de caixa; sabe que, ao abordar uma dessas perspectivas, não falará sobre a outra, mesmo que ela esteja lá.

Portanto, aquele que, a partir de uma perspectiva consegue intuir e compreender as demais terá uma visão mais completa e de unidade do negócio como um todo.

Entretanto, a perspectiva tem de ser verdadeira para ser funcional, isto é, para cumprir seu papel de ajudá-lo a compreender o todo com unidade.

A PERSPECTIVA TEM DE SER VERDADEIRA

Se tiro uma foto preto e branco de alguém, sei que a pessoa não possui somente estas cores. Mas, também observo que a foto preserva a forma verdadeira de seu rosto e os nuances de luz ficam mais destacados e as proporções verdadeiras também estão lá.

Ou seja, ver uma foto preto e branco de alguém é uma perspectiva que destaca certos elementos do indivíduo e que nos ajuda a compreender melhor a realidade.

Entretanto, vamos supor que uma pessoa tenha 1,81m, como eu, e queira tirar uma foto que a faça parecer com 2 m de altura. A menos que isto seja feito como uma metáfora artística, é evidente que não se trata da realidade.

Toda vez que uma informação não o ajuda a enxergar a realidade, seja muito crítico a respeito, pois pode fazê-lo tomar decisões equivocadas na empresa e na carreira.

A PERSPECTIVA GIRATÓRIA

Já fui consultado por indivíduos que, ao saírem da carreira técnica e passarem para uma gerencial, preocupavam-se com isso por não saber se o mercado valoriza mais o generalista ou o especialista.

Bem, não existe um mercado genérico, mas ele se manifesta na forma de empresas e demandas específicas. Entretanto, um executivo para crescer deve preocupar-se em compreender cada vez mais as diversas perspectivas da empresa. Ou seja, se ele trabalha no setor financeiro, por exemplo, deve conhecer como pensa alguém de marketing ou de RH e como essas diferentes perspectivas formam a unidade da empresa, principalmente perante o cliente.

Essa perspectiva giratória é possível por meio de muito interesse em conversar com as pessoas das diversas áreas e com a imaginação necessária para ver sua integração, tensões, oposições e interesses.

Se você não faz isso, acaba por ver o mundo dentro de uma bolha e contribuir para que a empresa opere subdividida em feudos que não possuem unidade de ação. Isto gera muito estresse e esforço desnecessário para cumprir o propósito da empresa.

Portanto, ter consciência de em qual bolha você se encontra e procurar sair dela é uma preocupação que deve ser constante para o amadurecimento do executivo.

É claro que a empresa pode ajudá-lo nisso por meio de ações e treinamentos de integração, mas você deve ter este interesse como indivíduo.

O resultado a qualquer custo, o perfeccionismo, a visão focada somente no seu departamento e carreira, o desinteresse pelas consequências do seu pensamento e forma de agir nos demais setores são exemplos de bolhas nas quais muitos executivos vivem.

O risco é sempre você pensar que sua bolha é a realidade completa e que não há outras perspectivas válidas.

Isto faz um gerente tomar decisões equivocadas e, nos casos mais graves, um executivo inadvertidamente atrelar a imagem da companhia a uma visão anacrônica e distorcida da realidade.

Portanto, o segredo é: reconheça que você vê a realidade por uma perspectiva específica, interesse-se em conhecer outras perspectivas válidas, seja crítico quanto àquelas que não refletem a verdade, integre as demais e observe como elas se relacionam para formar um todo, principalmente perante o cliente e os acionistas.

A habilidade de articular esses inúmeros pontos de vista o faz compreender melhor como atingir os objetivos que deseja em sua carreira e empresa.

Afinal, tão importante quanto chegar ao topo da montanha é conhecer bem o caminho que leva a ele e apreciá-lo, é claro.

Conte comigo no que precisar para isso. Vamos em frente!

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Silvio Celestino

Sócio-diretor da Alliance Coaching